segunda-feira, 18 de dezembro de 2017

A perigosa Reentrada na Atmosfera da Capoeira

Se afastando da Capoeira, cuidado ao voltar...!!


Tenho observado há tempos um fenômeno que é muito conhecido da maioria dos capoeiristas, mormente os que estejam em franca atividade, produzindo, treinando, dando aulas, vivendo-a, enfim. Esse fenômeno é muito comum e se caracteriza pelo afastamento, em maior ou menor tempo, do movimento que a capoeira produz, de natureza social, desportiva, política e, principalmente, competitiva, onde todos conhecem todos, se unem entre si, os próximos e se competem, os mais distantes.

A capoeira é uma entidade viva. Tem uma energia densa e complexa. Só os iniciados nela a compreendem o suficiente para amá-la ou deixá-la, dependendo do momento histórico em que se aproximem, se tornem capoeiristas, ou façam parte daqueles que dominam um determinado momento da sua História.

A Capoeira é muito forte! Forte em seus elementos de união, como também naquele tipo de resistência que permite aos seus praticantes, participantes, mestres e adeptos em geral, se tornarem verdadeiros guerreiros do bom combate (lutam contra a covardia, a tirania, a ignorância, etc.), como também existem os que combatem por si mesmos, formando grupos altamente unidos em torno de uma ideologia estabelecida pelo seu líder, que também é muito comum em nossa Arte.

A capoeira também tem um respeito muito grande pelos seus ancestrais. Sem dúvida tem!

Esse respeito é tão grande, que por causa disso alguns adeptos querem se tornar velho mestre muito cedo, daí a razão de pessoalmente eu ter cunhado uma patologia social muito comum na sua prática, que denominei: Síndrome da Velhice Precoce. Ou seja, pessoas que, embora razoavelmente novas, já querem se comportar como se fossem um mestre antigo, naturalmente para ter direito ao tratamento como tal e com isso ter regalias, como ter um tratamento diferenciado, receber homenagens, ser respeitado e, principalmente, ser poupado da obrigação de estar em forma, treinar, praticar, ensinar, jogar inclusive, etc.

Por tudo isso é que o verdadeiro Velho-Mestre, tem muito respeito dentro da capoeira.

A combinação dessa vontade de ser importante e a momentânea ou demorada necessidade de se afastar da capoeira, no entanto, produz um perigoso efeito de uma desconfiança e muita restrição aos que incorrem ou simplesmente se afastam por problemas que eles não podem controlar. Os capoeiristas olham com muita indignação aqueles que se afastam. Mormente os que voltam. Pior ainda, os que voltam e reivindicam seu direito às regalias dos velhos mestres.

Nesse momento é que se observa melhor esse fenômeno: a reentrada na atmosfera da Capoeira!

Imagem da reentrada na atmosfera da Terra


Já assisti muitas vezes a manifestação da indignação dos capoeiristas com relação a isso. É natural que quem está na labuta constante e exaustiva da prática de uma Arte-esporte, as vezes lutas inglórias, desgastantes viagens para participar de eventos, trabalhos dando aulas e promovendo eventos, enfrentando sérias restrições de meios, o que é outra faceta da luta dos capoeiristas, superando barreiras e inúmeros tipos diferentes de restrições e, de repente, surge alguém que para eles "abandonou o barco", quase sempre num momento difícil, mesmo porque todos os momentos da História da Capoeira são difíceis para quem está naquela situação, sustentando-a, fazendo-a se tornar hoje, um dos maiores movimentos da cultura popular da História de nosso país, já extensiva ao mundo inteiro, que combina em sua prática a educação, a prática desportiva de grande valor, a socialização, a Arte musical e o aprendizado prático de instrumentos rudimentares, mas que dão àqueles que nada sabiam de música, que não tiveram oportunidade de nenhum aprendizado musical, se tornarem muitas vezes excelentes cantores, ótimos percussionistas - alguns se profissionalizam e são respeitados nisso... enfim, a capoeira é múltipla e no caminho de quem a faça estão inúmeros desafios de superação pessoal e coletiva.


Esquecendo as contribuições e se tornando hostil aos reentrantes



Esse fenômeno, também, por vezes, guarda um lado que o torna delicado e até perigoso, pois quem, na sua vontade de retornar para o epicentro da capoeira, pula algumas gerações entre sua saída da cena e seu retorno, pois a capoeira é viva e de revezamento constante entre os seus praticantes. Sempre tem aquela pessoa que está no seu comando a cada momento, quem está representando sua energia, sua força, sua pulsante atração para quem a vê e, mais ainda, para quem teve que se afastar ou se afastou por vontade própria!

Nesse contexto, encontramos um outro fenômeno social, esse se trata de uma característica fundante da nossa sociedade como um todo, que é a questão da falta de memória ou fácil esquecimento da própria História. Nada sabemos, de fato, de nossa História. Por isso somos um povo sem memória. Isso é tão verdade que muitos políticos, por exemplo, já condenados e até banidos do cenário da política, voltam tempos depois e se aproveitam dessa falta de memória e se reelegem sem nenhuma dificuldade, pois ninguém se lembra mais o que ele fez de errado!

E se isso é verdade com relação aos erros, também é verdade com relação aos acertos. Ninguém se lembra mais do que aconteceu de bom, da contribuição de quem esteve no momento que teve que lutar pela capoeira, de sustentá-la e de fazê-la seguir seu curso na História, reificando-a em cada nova página que a História do contexto em que ela se insere, assim é que a Capoeira sempre acontece!

A Capoeira precisa sempre desses guerreiros para reenviá-la para o futuro. A cada momento, uma nova geração surge e retoma sua sustentação, carregando aquele bastão de sua conduta para as próximas gerações e, esse momento e essa energia, já acontecem por longos séculos. Alguém tem sempre que estar carregando esse importante bastão. Senão a chama se apaga e a capoeira perde sua força!

Quando se afasta, a principio, o capoeirista abdica de todos os seus direitos adquiridos durante seus dias de dedicação à Capoeira!

Logicamente, essa ideia de "abdicar" é uma visão extrema! É como se admitíssemos que somos todos ingratos e isso não é verdade!

Essa possibilidade de acontecer esse esquecimento na verdade existe!

Isso acontece porque as gerações seguintes, depois de algumas outras, aquelas que conheciam o trabalho, o jogo, a competência, a dedicação ou o que for. Simplesmente se tornam vultos dispersos do passado. Somos assim. Esquecemos tudo! Não damos muito valor ao que passou.

O caso de Brasília...! 


Essa cidade foi inaugurada há muito pouco tempo, relativamente, se comparada com centros como Salvador, Rio ou São Paulo e ainda lutamos para conseguir fundar alguma tradição, ou nossas pessoas de referência, que possam ser consideradas representantes da nossa tradição.

Mas se olhar direito, a gente vai ver que já temos algumas características bem definidas, bem reconhecidas. Uma delas é o fato de nossa capoeira ser respeitada por todo canto. Temos razões de sobra para verificar e acreditar que temos uma capoeira forte, saudável, reconhecida como dentre as melhores praticadas no Brasil e no mundo afora.

Ai resta uma questão: de onde vem isso??!! De que raízes vieram essa capoeira forte e respeitada que nosso Distrito Federal respira?! Quem ou o que produziu essa linhagem de capoeira que se tornou tão importante?! Logicamente isso não nasceu hoje, ou exclusivamente com a geração que ora habita e ocupa nossas rodas, nossos eventos, no cenário de Capoeira do Distrito Federal...!

Nascida na década de sessenta, a cidade já alcançou sua maturidade e personalidade em termos de Capoeira! De onde vem isso?! Certamente essa geração das primeiras décadas do ano 2000, já é herdeira de alguma base de conhecimento, de uma força e uma energia técnica e estética que alguém criou. Não temos como negar isso. Mas se não houver a quem agradecer por isso, também não teremos de quem herdar. Não fizemos sozinhos.

Outro dia estava em um evento no interior do Pará e um camarada me perguntou:

- Mas se o Mestre Bimba foi tão importante, por que não vemos os discípulos dele?! Onde está a linhagem deixada por ele?!

Eu perguntei para ele:

- Você usa um golpe chamado Armada?! Usa o toque do São Bento Grande de Regional?! Faz evento de batizado, usa graduação, etc?! Então, meu irmão, você é um dos herdeiros da capoeira deixada pelo Mestre Bimba. Mas você, como a maioria de nós, nem sabe disso. Não percebe que você recebeu de graça todo o trabalho e sacrifício que dezenas, talvez centenas de gerações anteriores a você fizeram na capoeira para deixar para seu uso hoje em dia! Ou você pensa que inventou tudo isso?!

Meio sem graça a pessoa teve que reconhecer que estava falando uma grande bobagem quando perguntou onde estava a herança de Mestre Bimba.

No caso de Brasília, o estilo arrojado, moderno, objetivo, eficiente, ritmado, firme e agressivo tem um ancestral comum: o nome dele é Aldenor Carvalho Benjamin, que ficou conhecido como Mestre Arraia. Que foi um dos pioneiros da capoeira do Distrito Federal e ensinou aos primeiros capoeiristas residentes e nascidos aqui. Ele simplesmente é o grande ancestral comum da maioria dos capoeiristas do Plano Piloto, embora com a dispersão da linhagem em diversos novos nós, as pessoas não mais saibam disso.

Decorrente dessa influência arrojada e inovadora, independente e muito forte, a capoeira de Brasília se tornou um dos movimentos mais influentes na capoeira modernizada em todo o país e mundo afora. Mas, assim como o rapaz do Pará me disse, pouca gente sabe disso!

Brasília criou os primeiros modelos de trabalho com a capoeira fora da Bahia, em sala de aula; em grupos mistos de homens e mulheres treinando juntos; incluindo a calistenia (treino de ginástica localizada, como abdominais e outros exercícios da ginástica estranhos à capoeira originalmente; também aqui se criou o primeiro sistema de graduação fundamentado na ancestralidade afro-brasileira; uniformes, estilos de jogo mais acrobático embora objetivo; essas, entre outras inovações, como ter a primeira mulher a receber uma corda vermelha no Brasil e, portanto, no mundo... enfim, as nossas inovações vão longe!

Mas, como dizia, poucos capoeiristas sabem disso. A razão é a deficiência da nossa memória. Talvez o ensino da ancestralidade devesse ser obrigação dos professores e mestres. Mas não é! Nada é obrigatório e cada um escolhe, prioriza, o que quer ensinar!

Com isso, naturalmente, vão ficando grandes buracos no conhecimento das novas gerações sobre seus ancestrais comuns! Ninguém pode impedir ou mudar isso. Acho.

Como disse acima e como se diz na capoeira: quem não é visto, não é lembrado!

Só mesmo com muita boa vontade iremos preencher essa imensa e injusta lacuna que vai ficando nos legados que chegou até nós.


O outro lado dessa moeda... 


Certamente temos também os casos em que as pessoas que ficaram afastadas voltam e reclamam seus direitos e nem sempre elas tem esses direitos. Não tem como saber. Quem desconhece a História, não vai saber quem é merecedor de reconhecimento e quem não é!

Por isso esse assunto ainda vai circular muito entre nós. Principalmente agora que a Capoeira tem valor, um valor muito maior do que já teve. Um valor que não dependeu de nenhuma ajuda a não ser dela mesma, de seus valorosos guerreiros que lutam todos os dias de suas vida, para que ela ocupe o pódio em que está! A capoeira venceu todos os seus desafios para chegar até aqui, na sua plenitude e cidadania madura. No estágio mais elevado da consciência de seus mestres e professores. A Capoeira venceu porque alguém a sustentou nos seus braços e ombros enquanto caminhava pelos difíceis momentos de ameaças, de perseguição, de discriminação, de desvalorização...!

Mas quem são essas pessoas? Isso não importa. Importante é a Capoeira, uma entidade viva que suplanta todos os seus elos e segue vitoriosa para onde talvez nenhum de nós irá ver!

Só podemos nos preparar, os que hoje seguram essa onda de carregarem a capoeira nos seus braços, pernas, ombros e, principalmente, no coração, sabendo que, no futuro, terão que provar que são dignos de serem reconhecimentos como legítimos velhos mestres. 

Para isso é melhor ter seus próprios discípulos e amigos capoeiristas, pois o coletivo, esse não está preparado, culturalmente, para saber o que houve há algumas décadas, já que a nossa memória não está treinada para guardar informações além de nossa própria aventura pessoal. Nossas vitórias, nossas derrotas. Ninguém estará interessado em contar.

Assim seguimos nosso caminhar rumo ao destino que Deus e Oxalá nos permita cumprir!














quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Évora, um novo capítulo na Capoeira. O verdadeiro encontro de Bambas!

Um novo tempo... ou o resgate dos velhos tempos?!



Após minha participação no último Nosso Encontro em Évora, incrível cidade medieval portuguesa, tombada e conservada com seu ancião estilo urbano, mantendo inclusive seus muros tradicionais da época, em setembro último (2017), me recolhi na expectativa de relatar o que vi e vivi naqueles dias que ali estive. Era um impasse que me colocava num dilema: ou o que eu vi estava completamente fora da realidade da capoeira atual, ou nós, lato senso da capoeira, estamos equivocados em algum ponto!

Pensei, pensei e repensei...! 
O que está errado com a nossa Capoeira...!?
Évora, me trouxe uma felicidade e, ao mesmo tempo, uma angústia...!
Me fez perceber que estamos fazendo uma coisa errada, des-encaminhando nossa capoeira para rumos equivocados e provavelmente sem volta!
Mas demorei muito procurando a maneira certa de falar sobre isso...!
Não quero briga com nossos milhões de felizes jogadores de perna, hoje chamados de capoeiristas, espalhados pelos quatro cantos do Brasil, como também mundo afora!
Não quero criticar ninguém!
Quero apenas ser sincero e se possível útil a essa Arte Secular que abracei e que me abrigou em seu seio generoso de verdades, de mandingas e de tanta energia!

Estava ali, vendo aquela roda cheia de estrangeiros, em plena Praça do Geral, Centro de Évora, onde uma centena de pessoas disputavam, tanto a oportunidade de se expressar naquela roda, ou simplesmente assistir e se deleitar, com os jogos que iam acontecendo, contagiando a todos com sua beleza e, principalmente, com a emoção que despertavam...! 
Emoções fortes rolaram...
Quedas incríveis...!
Entradas perfeitas e saídas competentes... no tempo milimetricamente certos...!
Havia algo que eu não via há longo tempo. E nem me considero tão antigo assim!
Havia um equilíbrio, uma verdade de roda e uma aceitação diferenciada pelo prejuízo que alguém levava durante os jogos!
Onde andaria esse espírito de jogo... que ninguém interrompe quando o jogo flui...?
Onde estariam esses nossos bambas de capoeira, que aceitam quando tomam um prejuízo e não se tornam - como se tornou comum - agressivos...!!?
Onde estariam nossas rodas de capoeira em que todos vibram com os jogos, mas não tentam desprezar quem levou desvantagem?
Eram muitas perguntas que me vinham.
Mas faltava uma questão básica:
o que havia de estranho em nossas rodas de capoeira desde o início da Capoeira Regional de Mestre Bimba, e essa realidade que estamos vendo proliferar nas nossas rodas...!!??


Roda na Praça Geraldo - Évora 2013
(Autoria: Sandra Carvalho)


Algumas luas depois de minhas inquietações, eu finalmente entendi o que estava errado:

- Estamos traindo a causa primeira que Mestre Bimba viu na capoeira, a da objetividade... do jogo efetivo... o jogo de resultado... o fim da capoeira estéril, falsa, sem força e sem expressão... vendida em qualquer esquina do planeta hoje... sem disciplina e sem profissionalismo!

Pois a verdade é que estamos vendo prosperar uma capoeira sem graça!
Estamos misturando nossa necessidade de nos expressar, de nos mostrar nas rodas, de uma forma tão sem sentido, que a maioria dos jogos não dura nem o tempo mínimo para acontecer alguma coisa: alguém já corre e compra...!! É como se a gente quisesse dizer: eu não jogo, mas não deixo ninguém jogar!!!!

Convenhamos...! Precisamos rever isso. Antes que seja tarde!!

Temos excelentes atletas na capoeira...!
Temos excelentes capoeiristas, mas esses que tem essa competência não têm oportunidade de fazer um jogo bonito... alguém compra em poucos segundos seu jogo!! 

O que Évora me mostrou foi mais de uma centena de pessoas educadas, capazes de abrir mão de seu próprio ego, para assistir um bom jogo, reunidas num mesmo evento...!!

Vi mestres criativos e organizados, que não interrompiam um jogo bonito, que sabiam a diferença entre um jogo comum e um especial, cheio de magia, de efetividade e, para mim o melhor, o gol no jogo...! o resultado... ou pelo menos momentos de grande vibração...!!

O que vi também foi uma razão para estarmos perdendo tantos bons capoeiras para outras artes-marciais: não estamos permitindo que ninguém desenvolva um bom jogo de capoeira! Esses jogos são fundamentais para desenvolvermos nossa capacidade de obter resultados no nosso aprendizado!! 

Também acontece que, ao apagarmos o brilho dos jogos de nossa capoeira, nos tornamos sem graça para a platéia. Jogamos para uma plateia alheia que vê uma roda de capoeira e a compara com todos os outros esportes radicas. 

Quem não estiver me entendendo, prestem atenção nas rodas que acontecem pelos quatro cantos: nenhum jogo dura mais de 5 segundos... quando muito!!! Aí eu me pergunto: como vamos desenvolver nossa Arte se ninguém tem tempo suficiente para se manifestar...!? Sem poder fazer acontecer um jogo de decisão,  um jogo bonito??

Infelizmente estamos a cada dia perdendo o brilho de nossa Arte. E enquanto não revertermos essa situação a capoeira estará caminhando somente para o seu extermínio enquanto Arte e esvaziada de seus maiores conhecimentos: a Arte da Sobrevivência no meio de uma situação difícil...!

Depois de alguns meses em que estive naquela atmosfera de bambas do povo, sem estrelas, apenas capoeiristas de brilho, como deve ser, ainda sinto os ecos daqueles momentos e percebo que esse evento (2017) não foi um acidente. Isso se acumulou nos anos que Évora vem se tradicionalizando entre os que ali se refugiam, que se encontram e confraternizam em emoções e alegrias pulsantes, mesmo para os nossos capoeiristas europeus, tão serenos e racionais, eles também apreciam - quem não o faz!! - uma roda bonita, um jogo bonito, uma volta do mundo mandingada... uma boa Capoeira, sem sobrenomes... sem ninguém dominando os momentos da roda, a cantoria, os jogos, um verdadeiro celeiro de bambas, anônimos, só preocupados com uma única e exclusiva coisa: que a Capoeira possa descer ali, na milagrosa transcedência dos desiguais, dos diferentes, dos distintos, dos graduados e não graduados, transmutação de uma energia que se torna a verdadeira chama que todos buscamos para nossa arte, em paz, mas em seu pulsar mais sagrado, mais relutante contra essa hegemonia estéril que está tentando anular nossos fundamentos, transformando-os em regras estereotipadas, medidas pela espessura dos bíceps ou dos abdômens perfeitos...! 


A roda é o lugar do mais fraco encontrar sua afirmação e sua emancipação enquanto ser igual, enquanto o portador da divina chama de Filho de Deus, que tantos pregam, mas tão poucos sabem o verdadeiro significado, na prática! 
Roda também é o lugar do Mestre se encontrar em sua dimensão de respeito ao próximo, aos ancestrais, se conectar na dimensão mais profunda de sua alma. Receber a concessão do sagrado para encontrar sua entidade interior (como dizia o Mestre Decânio) e se manifestar no espaço comum de todas as almas e consciências. 


Mestres ao pé do berimbau 

Roda do gramado - Piscinas de Évora - 2017
(foto: Professor Oclin_


Por isso tudo é que só posso afirmar, depois de contabilizar todos os prós e contras, verificar a efervescência de tantos eventos, cada um clamando por ser o melhor dos melhores, que o Nosso Encontro de Évora é uma dessas tradições que tem muito para ensinar a todos quantos tem a humildade de aprender. 

Por isso que só nos resta panfletar essa rica experiência de todos quantos ali já percorreram: 
   Viva nossa Capoeira de verdade!!
Viva os capoeiristas que não estão permitindo que suas rodas se tornem estéreis e sem nenhum realismo!!
Viva Évora e sua capoeira de bambas de verdade!!!